Por Stella Fontes | De São Paulo
Mais do que a greve dos caminhoneiros, que complicou a vida da indústria nos dez últimos dias de maio, a forte valorização do dólar deu o tom do resultado das companhias de celulose e papel no segundo trimestre. Juntas, as três maiores empresas do setor listadas na B3, Fibria, Klabin e Suzano Papel e Celulose, tiveram despesa financeira líquida de quase R$ 4,5 bilhões, por causa da desvalorização de 16% do real frente ao dólar, e encerraram o intervalo com prejuízo líquido consolidado de pouco mais de R$ 3 bilhões.
Por uma circunstância específica – a operação com a Fibria -, a Suzano acabou sendo a mais afetada pelo avanço do dólar, que ganhou força em junho depois de os Estados Unidos entrarem em guerra comercial com a China. O anúncio do presidente Donald Trump, de imposição de tarifas sobre US$ 50 bilhões em importações chinesas, veio em meados daquele mês, mas dias antes a cotação do dólar já refletia o nervosismo nos mercados.
No Brasil, a moeda americana chegou a R$ 3,90 ao auge no início daquele mês, partindo de R$ 3,32 no fim de março. No fim do semestre, a cotação era de R$ 3,86 e a escalada só não foi maior porque o Banco Central fez intervenções sistemáticas no mercado a partir da segunda metade de maio.
Enquanto China e Estados Unidos preparavam seus canhões, a Suzano dava andamento à estratégia para proteger da variação cambial a dívida que está tomando para comprar a Fibria. São mais de R$ 29 bilhões, correspondentes à parcela do pagamento em dinheiro, assegurados por US$ 2,3 bilhões em pré-pagamento de exportações e um empréstimo-ponte, reduzido de US$ 6,9 bilhões a US$ 4,4 bilhões após a emissão de uma debênture de R$ 4,68 bilhões e de nota de crédito à exportação de R$ 771 milhões.
Sem alarde, como é de costume em operações dessa natureza, a Suzano começou a montar posições de hedge em abril. Em maio e junho, a contratação desses instrumentos ganhou ritmo e em julho foram fechados os últimos contratos, ao menos por enquanto, cobrindo 81% do compromisso com os acionistas da Fibria.
Havia expectativa de desvalorização da moeda brasileira, tanto que a companhia travou o dólar a R$ 3,63, frente à cotação de R$ 3,29 no dia em que foi anunciado o acordo para compra da Fibria, em março. Mas o anúncio de Trump potencializou os ganhos da moeda americana na reta final do trimestre.
Em 30 de junho, quando obrigatoriamente as companhias corrigem o valor dos passivos que carregam em moeda estrangeira e o traduzem para o real, a Suzano usou a cotação de fechamento – R$ 3,85, acima dos R$ 3,63 do hedge. Assim, o resultado negativo das operações com derivativos ficou em R$ 1,75 bilhão, mais R$ 803 milhões da proteção da dívida e do fluxo de caixa. No restante do passivo em moeda estrangeira, o efeito da variação cambial foi negativo em R$ 1,47 bilhão. Não há efeito no caixa, se não houver dívida vencendo no período, mas é o regime de competência que manda nos balanços. O valor mudou, registra-se.
As circunstâncias, aliadas à dura lex contábil, fizeram a Suzano encerrar o trimestre com o maior prejuízo entre as três, de R$ 1,85 bilhão – e a maior da empresa desde que o Brasil adotou as regras internacionais de contabilidade, em 2010. Os balanços de Fibria e Klabin também refletem essa oscilação do câmbio, mas em outra dimensão. Na primeira companhia, a variação cambial e monetária foi negativa em R$ 1,5 bilhão e o resultado de hedge, também negativo, ficou em R$ 480 milhões. O prejuízo líquido foi de R$ 210 milhões. Na Klabin, a variação cambial líquida foi negativa em R$ 1,8 bilhão, o que explica o prejuízo de R$ 955 milhões. A empresa trabalha com o conceito de hedge natural, em que a estrutura da dívida em dólar está atrelada à projeção de receitas com exportação.
O estrago não foi maior porque o segundo trimestre foi marcado por preços mais altos da celulose e do papel, e pelo benefício do próprio câmbio nas receitas com exportação.
É sempre assim: quando o dólar oscila muito, as receitas e o resultado financeiro das três empresas, que são exportadoras e têm boa parte de sua dívida em moeda estrangeira, acompanham esse movimento. A moeda americana mais forte ajuda as receitas com exportação, mas piora o resultado financeiro. No sentido oposto, a desvalorização do dólar não é benéfica para as vendas externas, mas tem impacto positivo na linha financeira, já que a dívida em moeda estrangeira fica menor. Juntas, as três companhias tiveram receita líquida de R$ 10,2 bilhões, alta de quase 40% na comparação anual.
Leave A Comment