Aumento do emprego e liberação de mais crédito e prazo de pagamento ajudaram a incentivar a demanda

Por Adriana Mattos — De São Paulo

Nas últimas semanas, a publicação de dados conflitantes sobre o desempenho do varejo tem gerado dúvidas sobre a velocidade de retomada do consumo. Para traçar um cenário mais claro, o Valor ouviu associações, consultores e empresários, e eles afirmam que o processo de recuperação na demanda, apesar de paulatino, continua em andamento. Essa retomada, verificada após maio, se estendeu até o fim do ano, e não há sinais de nova retração nas vendas.
Varejistas afirmam que as vendas de duráveis e semiduráveis em dezembro foram mais fracas que novembro, mês do evento da “Black Friday”. Mas em dezembro houve leve crescimento sobre 2018.

A expansão na geração de empregos, ainda que vagarosa, somada à maior liberação de crédito e ao aumento nos prazos de pagamento entre 2018 e 2019 funcionam como incentivos à demanda.

As redes constataram que as cadeias que mantiveram o ambiente de loja com ações de incentivo à compra, como emissão de vouchers e brindes, e com táticas promocionais desde antes do Natal, têm tido uma recuperação mais acelerada após a “Black Friday”.

“Tudo indica que dezembro não foi excepcional, e como a inflação se acelerou após novembro, com alguns alimentos subindo, o ambiente acaba exigindo que o varejo busque ações para manter tráfego”, diz Fabio Bentes, economista-chefe da CNC, a confederação do comércio, serviços e turismo.

O Carrefour destacou esse ponto em seu material ao mercado na quinta-feira. O comando da Hering disse, em conversa com analistas dias atrás, que redes que vendem “presentinhos”, de R$ 20 a R$ 30, têm tido um desempenho melhor. Com menor foco nesse segmento no fim de ano, a empresa teve queda de 5,2% nas vendas brutas no quarto trimestre.

“Passaremos a ter uma combatividade maior em preços nas próximas datas promocionais, como Dia das Mães e dos Namorados, com ações mais geradoras de fluxo”, disse a analistas Thiago Hering, diretor de negócios.
Segundo Sébastien Durchon, diretor financeiro do Carrefour, dono do Atacadão, houve uma “ressaca” no atacarejo pós “Black Friday”, com recuperação ao longo do mês. “Em geral [no varejo e atacado], preferimos não subir preços, mantendo a competitividade das lojas físicas”. O grupo fechou o quarto trimestre com alta de 11,5% nas vendas, no ano subiu 10,4% (o setor deve crescer 3%).

Para Henrique Mascarenhas, diretor da consultoria GfK Brasil, “não existe hoje aquela euforia como em janeiro de 2019, algo que não tinha bases estruturais para existir”. “Vemos uma consistência na recuperação, ainda que gradual, em algumas categorias. Nos bens duráveis, essa retomada é mais forte que a média do comércio.”

Varejistas que respondem por 80% das vendas do setor enviam dados mensais à consultoria. Em novembro, pesquisa da empresa indicou alta nas vendas de eletrônicos de 16% sobre 2018, e em dezembro, o índice deve ficar estável, na média do ano, 10% (em valor).

Segundo a Eletros, associação dos fabricantes de eletrônicos, a indústria cresceu quase 5% no ano passado, para pouco mais de 100 milhões de unidades fabricadas, de acordo com dados antecipados ao Valor. Até setembro, a alta era maior, de 7%. Perguntado sobre essa desaceleração, o presidente da entidade, José Jorge do Nascimento Júnior, nega que tenha havido um desaquecimento generalizado nos últimos meses de 2019.

“O que aconteceu é que os portáteis perderam vigor porque vinham numa aceleração acima da média, com alguns produtos indo muito bem. Isso se acomodou”, diz. “Mas ao se analisar a venda de TVs, com 80% do mercado de ‘linha marrom’, a alta foi de 3% em 2019, puxada pela venda de novembro e dezembro. E foi uma alta em cima de 2018, quando houve Copa do Mundo”. Após o evento, há estabilidade nas vendas.